CONVIDEI PARA UMA RODA DE CONVERSA os fantasmas que me habitam. O primeiro a chegar foi o Não Pertencimento. Entrou com seus braços e pernas enormes, esbarrando em si mesmo e com medo de incomodar. Olhou em volta como a procurar seu canto e, sem que o pudesse achar, se ajeitou desajeitado em um canto qualquer.
Logo atrás dele veio a Carência com seus olhos grandes e famintos. Sorria um sorriso triste, arrastando um longo e pesado véu, e ocupou o lugar mais afastado de todos.
Depois entrou o Medo, de peito estufado, querendo impedir o tempo de passar. Disfarçado de lutador, mostra sempre a sua espada cortante a tudo o que é novo. Chegou e se sentou, logo na entrada, em posição de alerta.
A Expectativa, senhora vistosa e alegre, entrou cantando como de costume. Passeou o olhar pelo espaço e se manteve em pé, exibindo os penduricalhos brilhantes que ela rouba de histórias alheias.
E por último, a Onipotência, filha dileta do Medo, ela costuma me olhar com óculos de aumento e me convence sempre de que eu vou dar conta, contra todos os indícios da impossibilidade real. Sentou-se à frente de todos.
Sentam-se os cinco na antessala da minha dor. Olho cada um deles com ternura e aceitação. Fazem parte de mim. Procuro saber das suas histórias e eles contam. Não há precisão na data da sua chegada. Nem consigo saber a ordem em que apareceram.
Chegaram até mim há muito tempo. Provavelmente pelas frestas deixadas por aqueles que cuidavam ou que pensavam cuidar de mim. Fizeram o que sabiam e podiam fazer. Não os culpo.
Acalento em meu colo o Não Pertencimento e encontro o meu lugar. Seguro as mãos da Carência, mostro-lhe o que construí, a fome de seus olhos arrefece e eu me sinto completa. Abraço com força o Medo, ele solta a espada e eu aceito o novo tempo. Olho com firmeza para a Expectativa, ela diminui o seu canto, devolve o que roubou das histórias alheias e eu descubro a beleza do instante presente. Tiro os óculos da Onipotência, ela se assusta um pouco, mas percebe a minha real medida e eu encontro a força do que é possível em mim.
Nós nos olhamos amorosamente (os seis). Os cinco fazem parte de mim.
Sou eu agora, a cuidadora de mim mesma.
Autoria: Jane Hir, Mestra em Educação pela UFPR, facilitadora em práticas restaurativas e autora do Curso e do E-book sobre Comunicação Não Violenta.
Este texto faz parte do Curso CNV. A Comunicação Não Violenta (CNV), desenvolvida por Marshall Rosenberg, é uma abordagem que busca promover conexões autênticas e empáticas entre as pessoas. Um dos pilares da CNV é o reconhecimento e a expressão das emoções de forma clara e responsável.
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